luto, tristezas e uma certa paz - 22

Canta o sol ao meio-dia uma saudade, muitas, tantas saudades, também o sol faz isso, hoje o do meio-dia, cada dia a saudade vem em suas vontades, em horários surpreendentes, o sol do meio-dia me planta recordações de estradas, de pomares, de água de côco e sombras gigantes de jaqueiras, de pessoas queridas, queridos que se foram, meio-dia no verão, era tão bom, não o meio-dia, nem o pomar, nem a sombra fresca da secular jaqueira, nem o riacho, nem o moinho, não, era bom estar ali com meus queridos, meus queridos, canta o sol, foi isso que eu disse, não chora o sol, canta, canta o sol ao meio-dia e me traz vivas ao coração pessoas que se foram, é que misturo aqui os que ficam e os que disseram adeus, os que chamam, perdão, é que misturo aqui as cinzas da quarta-feira, as cinzas da morte, e o adubo das rosas, as amarelas, aquelas que brincam de sol.
Luto, tristezas e uma certa paz - 21

Há coisas que não digo, fico de escrever e não escrevo, o que seria dito fica como o não dito, um pensamento bonito morre antes das letras chegarem, uma prece dirigida a ti, minha querida mãe, não por ti, mas a ti, mãe, umas frases em que gostaria de expressar meu desejo de que sejas feliz na imensidão do mistério de depois da vida, testemunho por escrito da nossa vida bonita que vivemos como mãe e filhos, não se viabilizam, morrem, e quando me disponho a escrever são outras as que dão um passo à frente, e se pronunciam em registros escritos. Bem... Abri teu armário outro dia, e aquele cheirinho - doce riacho de areias brancas atravessando o pomar, milharal verde ao amanhecer, passeio em torno da lagoa ao fim do dia, reza na capela em mês de maio - que exalava dos nossos abraços, ainda habita ali, minha boa mãe, mesmo que em veladas despedidas.